terça-feira, 14 de agosto de 2012

Vestido de Noiva



              Observar o vestido de noiva no brechó propiciou uma sensação no mínimo curiosa. Sempre a frase me recorda de imediato a peça do Nelson Rodrigues. A chave não é o traje em si. Não é a peça montada com tecido. O arquétipo é a peça de teatro. Primeira associação da mente. O vestido simbolizando a disputa entre duas irmãs pela posse do mesmo homem.

              Tenho uma relação avessa com esse tema. Aliás, é estranha a história: casar ninfeta era o desejo ardente de uma prima. A fantasia pretérita, não mais cabia nos seus vinte e um anos. Aos catorze anos fui obrigada a vestir um sonho que não me pertencia. O vestido guardado na caixa era uma espécie de luxo reservado. Justo, justíssimo na cintura. Enfeites e acabamentos ásperos machucavam a pele de quase menina.

              Tentava sorrir crucificada no vestido incompreensível. Naquela invisível costura entre as duas fases. Nem menina e nem mulher. Minha tia entrou, se chocou, e chorou. Gritou com a filha. Nunca mais me casaria de noiva, afirmou. Meneando a cabeça com tristeza, observava a minha frágil figura no traje completo: véu, luvas, sapato de cetim, buquê e nem sei o que mais o quê.

              Minhas lembranças são meio vagas dessa fase de “noiva” sem noivo da tal prima. Tempos depois ainda me coagiu a experimentar outra peça alugada, ou emprestada. Deve ter nascido ali, naqueles rituais entediantes e incrustados, a total indiferença pela coisa.

            Se nos romances policiais o criminoso é sempre o mordomo, nos romances errados, o culpado é o azarado vestido. Até me fez lembrar os relatos de uma moça que conheci e foi miss de uma cidadezinha de Minas Gerais. Linda, linda! Saiu do apartamento e rumou para o embarque em Congonhas. Perdeu o avião; voltou. Flagrou o maridão com outra. Dentro do quarto do casal. Terminou o casamento, e, para fechar com chave de ouro, jogou o vestidão caríssimo no lixo.

             Com o passar dos anos, consegui entender que cerimônia de casamento é um ritual antigo. As pessoas guardam as lembranças daquele momento por toda a vida. Movimenta negócios e gera milhares de empregos. É o momento glorioso da noiva.

              De minha parte, só posso dizer que fiz um juramento e cumpri: jurei nunca mais passar nem perto dessas roupas de nubentes. Assim tem sido por décadas e décadas. Amém.

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